15/08/2024 às 14h01min - Atualizada em 16/08/2024 às 04h01min

Demissões voluntárias recordes: o reflexo da insatisfação no ambiente de trabalho e a busca por equidade

Por Amanda Ramalho

KAMILA GARCIA
Davi Raiol
As demissões voluntárias cresceram no Brasil e bateram o recorde de 7,3 milhões de pessoas em 2023, uma fatia de 34% dos mais de 21,5 milhões de desligamentos registrados, segundo dados organizados pela LCA Consultores com base no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

O cenário indica que, mesmo o salário sendo um fator importante, ele está longe de ser decisivo na manutenção de postos de trabalho. Fica claro que funcionários aceitam propostas novas mesmo que sua remuneração se mantenha e, eventualmente, até aceitam uma remuneração menor. E por que isso acontece?

Questões como assédio (moral e sexual) e discriminações guardam íntima relação com adoecimento mental, sendo, inclusive, possíveis de serem consideradas como doença laboral, se comprovada a relação da condição com experiências vividas no ambiente de trabalho.

Mas não é só isso. Conceitos como o de employer branding (marca empregadora) têm ganhado especial destaque, em razão da geração Z, que avalia as empresas com quem deseja ter algum tipo de vínculo de trabalho. Saúde mental, flexibilidade e apetite de riscos versus remuneração são pontos relevantes na decisão de manutenção desse público nos quadros laborais.

Para dar mais força à questão, temos a exigência do mercado financeiro frente às boas práticas de ESG, evidenciando aqui as questões sociais. Diversidade, equidade e inclusão são fatores fortemente analisados para a concessão de investimentos.

O caminho atual mostra-se como uma porta estreita, em que as organizações privadas — e quem sabe também as públicas — precisam olhar, cuidar e repensar suas relações com as pessoas; começando pelo mínimo, que já é um dever regulatório: equidade de oportunidades e remuneração, e um ambiente livre de assédios e discriminações. Então, pode-se caminhar para o que se chama de employee experience (experiência do funcionário), onde as organizações pensarão seus processos a partir da lógica da valorização e respeito aos seus colaboradores, para, com isso, entregarem produtos e serviços da mais alta excelência.

A meta é ousada, porém, os profissionais de compliance, ESG, comunicação e gestão de pessoas, unidos em um projeto comum, podem, sem dúvida, propor as medidas necessárias à concretização desse objetivo, entregando à sociedade um meio ambiente empresarial e de trabalho muito mais qualificado e coerente.

Além da igualdade prevista na Constituição Federal e na Consolidação das Leis do Trabalho, vemos que, na prática, tais regramentos não se mostram suficientes para garantir a equidade no meio ambiente de trabalho. Neste diapasão, duas novas legislações foram incluídas: a Lei nº 14.457/22 (Emprega + Mulheres) e a Lei nº 14.611/23 (Igualdade Salarial). Ambas visam reduzir as presentes e insistentes desigualdades, especialmente no que diz respeito à ocupação de posições de liderança e equidade salarial entre homens e mulheres que ocupam cargos e funções iguais.

O que encontramos, na prática? Colegas juristas defendem a tese de que a emissão obrigatória de tal relatório é um abuso de poder e um excesso cometido pela legislação. Tanto é prova que foram ajuizadas ações por entidades empresariais, pedindo liminarmente a suspensão da obrigatoriedade, alegando o desrespeito à Lei Geral de Proteção de Dados, com o argumento de que o decreto (Dec. nº 11.795/23) e a portaria 3714/23 do Ministério do Trabalho e Emprego não dizem diretamente como os dados devem ser anonimizados.

Ora, vejamos, a mera referência à LGPD já indica que os parâmetros por ela estabelecidos devem ser aplicados ao caso em concreto. Pergunto: de que adianta termos uma legislação que trata de um assunto se temos que repetir em todas as demais, inferiores ou complementares, o que já foi dito? A mera referência não é suficiente?

A mim parece uma clara manobra visando exclusivamente a prorrogação da obrigatoriedade da publicação, a fim de garantir tempo suficiente para que os 'ajustes' necessários sejam feitos, ou seja, o medo efetivo das informações existentes no presente comprovarem o que já sabemos: a desigualdade deliberada entre homens e mulheres sem uma justificativa coerente para tal, que não seja a mera discriminação de gênero.

A mim, pelo menos, fica claro o receio da comprovação do pensamento, para mim já há muito comprovado, de que não se sabe explicar por que os gestores não contratam, não promovem e não remuneram adequadamente mulheres, a não ser a mera discriminação. Discriminação essa justificada sob a falácia de que a mão de obra feminina é mais cara para as organizações sob diversas perspectivas atreladas às suas características pessoais e, muitas vezes, à maternidade.

Não existe, contudo, justificativa razoável para tal, sendo as mulheres, em pesquisa do IBGE (2022), mais qualificadas que os homens. Segundo a pesquisa, 21,3% das mulheres concluem o ensino superior, enquanto os homens representam apenas 16,8% da população masculina.

Outro ponto que corrobora a falácia é a falta de divisão justa e igualitária do trabalho doméstico e familiar. O mesmo estudo indica às mulheres uma dedicação quase dobrada de tempo aos afazeres domésticos em comparação aos homens. Claro que, nessas circunstâncias, homens sempre estarão mais 'disponíveis'. Alguém, uma mulher, carrega o fardo da vida real para que eles possam ocupar e crescer, reforçando a falsa ideia de que dão conta de tudo. Se a lógica da equidade prevalecesse no lar, certamente teríamos um cenário diverso acerca da disponibilidade.

Existe um viés inconsciente que é compartilhado coletivamente e que coloca as mulheres em uma 'caixinha' de deveres e responsabilidades que muitas vezes sequer fazem sentido para suas características e escolhas pessoais.

Fato é que ainda temos um longo caminho até a equidade e, mais do que isso, para um ambiente que seja de fato equitativo (mas sobre isso falamos em outro momento) e que abrace as mulheres para o seu livre desenvolvimento pessoal e profissional.

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KAMILA BATISTA GARCIA
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